
Um velhinho parou com suas compras no meio da calçada. Eu me ofereci para levar, mas ele não quis. Eu podia ter me oferecido para conversar, talvez ele quisesse... Qual seria a necessidade dele naquele momento? Assim no restante da sua caminhada poderíamos falar sobre estrelas, mar, universo ou apenas: muito bonita sua camisa. Mas ele escolheu parar em frente ao bar para trocar outras palavras com outras pessoas.
Me toquei na hora: minha vó quando ia pagar conta na esquina de casa demorava umas duas horas, porque ela ia conversando com um e outro. Hoje caiu a ficha: Ninguém de vinte anos faria isso, porque todo mundo está correndo demais, ocupado com o emprego que pode não existir daqui há algum tempo ou mesmo com a noite que na verdade será dia.
Só que minha vó sabia que o importante não é a conta paga e sim o processo que a levava até lá. Ou seja: não importa como você vai trocar o óleo do seu carro, o que importa é o que você vai pensar e fazer as outras pessoas pensarem quando tiverem em contato com você. E aí vem minha hipótese: parar para florir: como uma planta, como aquele passo na festa junina. A planta chega na terra, conhece o lugar, respira e dá uma flor. E independente do terreno, ela pode fazer isso em qualquer lugar. Seja pagando conta, trocando pneu, batendo o carro: não importa o resultado “carro batido, carro arrumado” ... importa o processo : o controle dos sentimentos envolvidos, porque o resultado final sempre pode ser sempre, parar para florir.
Ontem no asilo, seu Raimundo me disse: tem quatro anos que estou aqui, esperando a morte chegar. Eu disse para ele: eu também estou. A questão do senhor ter setenta e eu vinte quatro não muda em nada essa condição.
O senhor acredita em céu? Ele disse: acredito, mas não é lugar para a gente, só para os deuses. Eu só queria estar no Maranhão. “Mas lá é muito quente seu Raimundo!”...eu disse, mas na verdade queria falar “Eu não vou estar lá, fique aqui que eu transformo esse asilo no Maranhão”.